Palcos de Guerra - Marta Mestre



A montagem da pintura e a sua apresentação corresponde a um processo cultural de colocação e ajustamento das imagens por relação a um observador. A exigência regular de um quadro é que se nos apresente à altura dos olhos, no espectro do nosso campo de visão, na distância ideal de observação de uma imagem. No entanto, esta exigência não é antiga, uma vez que as condições de visibilidade se reelaboram constantemente.

A exposição que Martinho Costa apresenta no Centro de Artes de Sines, proposta que pretende funcionar como reagente sobre aspectos da arquitectura da Sala Principal do Centro de Exposições, estimula as condições da percepção deste espaço físico. Sobre este aspecto tem particular relevância a antiga prática da montagem da “pintura histórica” num plano propositadamente elevado da parede. Esta prescrição esteve na discussão dos critérios de montagem promovida por artista, curador e instituição, mas foi posteriormente abandonada a favor de uma montagem que amplificasse a participação do espectador nos “palcos de guerra” (estamos dentro, como refere Bruno Marques curador da exposição). Ambas as opções, a defunta e a prevalecente, iluminam a relação de “bonne distance” entre o observador e a obra de arte, aspecto que é tanto físico como filosófico. A distância a partir da qual a visão apreende as coisas tem uma importância fundamental. Este aspecto foi reforçado pelo historiador Aloïs Riegl a propósito do binómio háptico/ óptico que, no caso vertente, permite considerar que ver e tocar são acções intermutáveis, de acordo com a distância que nos colocamos perante estas batalhas.

O conjunto Völkerwanderung (A Deambulação dos Povos), de Martinho Costa é igualmente pretexto para uma evocação das batalhas actuais do visível, adensadas pelas tecnologias do séc. XXI. É sobre isso que escreve Bruno Marques, relembrando-nos o espectáculo puro de um campo de batalhas sem lugar nem tempo, decalcado das consolas PC, que Martinho Costa explora “servindo” uma pesquisa alargada sobre os dispositivos do ver (e da vigilância). Em certa medida, este trabalho resume a seguinte questão: Quais são os elementos de continuidade que ligam a imagética contemporânea com as antigas organizações do visual?



Marta Mestre